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O luto por perdas que acontecem dentro da gente

  • Foto do escritor: temporacomunicacao
    temporacomunicacao
  • 7 de out.
  • 2 min de leitura

Coluna da psicóloga Franciele Sassi


O luto pela perda de identidade, ou seja, por aquilo que se modifica dentro da gente, que transforma quem a gente é, é uma forma de dor simbólica que se manifesta quando algo que antes nos definia — um papel social, um status, um vínculo, uma função ou um modo de ser — deixa de existir.


Não há, nesse caso, uma morte física, mas há uma ruptura profunda com uma parte de si mesmo, com uma forma de estar no mundo que organizava a vida e oferecia sentido. Essa perda pode ocorrer, por exemplo, após o fim de um relacionamento, a aderência à aposentadoria, a perda de um emprego, uma mudança de cidade, uma transição de ciclo de vida ou mesmo após transformações internas que nos afastam de antigas versões do eu.


Embora não visível, esse tipo de luto é real e doloroso. A sociedade tende a reconhecer e validar o sofrimento diante de mortes concretas, mas costuma desconsiderar as dores simbólicas, rotulando-as como exagero ou fraqueza. Isso faz com que quem sofre esse tipo de perda muitas vezes se cale, sinta vergonha da própria dor ou não encontre espaço para elaborá-la. No entanto, perder uma identidade — aquilo que nos dava lugar, pertencimento e valor — é também perder um pedaço da história pessoal. Deixamos de ser quem éramos num contexto conhecido para assumirmos novas formas em novos momentos de vida, desconhecidos e ameaçadores. E, como todo luto, trata-se de um processo que requer tempo, acolhimento e reconstrução.


O luto pela perda de identidade, apesar do sofrimento que provoca, por outro lado, pode se tornar um convite ao autoconhecimento e à transformação. Quando o que antes nos definia já não está mais presente, abre-se um espaço, ainda que doloroso, para revisitar quem somos além dos papeis que desempenhávamos e avaliar se, de fato, segue fazendo sentido aquilo que vivemos daquela forma. É nesse vazio simbólico que surge a possibilidade de criar novas narrativas sobre si, de reconhecer potências antes adormecidas, de compreender o que continua e o que se transforma em nós. Perder quem conhecíamos de nós mesmos não precisa ser ruim, muito pelo contrário, pode nos melhorar, amadurecer, evoluir.


Assim, esse luto não precisa ser visto apenas como fim, mas também como passagem. Um processo que, ao desestabilizar antigas certezas, pode nos aproximar de uma identidade mais autêntica e flexível — menos pautada pelo olhar do outro e mais sustentada por uma consciência interna de valor e sentido.


Em suma, o luto pela perda de identidade é um processo legítimo e necessário. Não há como passar uma vida inteira sem experimentar dessa vivência. Algo que nos acontece sempre nos transforma. Esse luto dói, porque nos confronta com o desconhecido e com a ausência de antigas referências, mas também pode ser um portal para o crescimento, um convite para olhar para dentro e se reencontrar em um novo momento da vida.


Franciele Sassi, Mestre em Psicologia Clínica, Especialista em Lutos, Perdas e Suicídio, Especialista em Apego e Vínculos, Intervenções em Emergências Pós-Desastre, colunista do Pauta Serrana.
Franciele Sassi, Mestre em Psicologia Clínica, Especialista em Lutos, Perdas e Suicídio, Especialista em Apego e Vínculos, Intervenções em Emergências Pós-Desastre, colunista do Pauta Serrana.

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